Resenha do livro “Breakneck: China’s Quest to Engineer the Future”: A Lição da China vs EUA e o Espelho para o Brasil

As resenhas de Breakneck: China’s Quest to Engineer the Future, de Dan Wang, destacam um livro que captura a essência da transformação chinesa e suas lições globais. Tyler Cowen, do Marginal Revolution, o chama de “o melhor livro do ano”, elogiando a execução implacável da China em engenharia e mercados. John Thornhill, do Financial Times, destaca a perspicácia de Wang ao descrever a transformação econômica e tecnológica da China nas últimas décadas, enquanto o The Sling aprecia os capítulos etnográficos que revelam os custos humanos, como políticas do controle populacional. A tese central, conforme Wang escreve em seu site, é que a China é um “estado de engenharia”, que “traz um martelo para resolver problemas tanto físicos quanto sociais”, em contraste com os EUA, uma “sociedade advogada” que “traz um martelo judicial para bloquear quase tudo, bom ou ruim”. Apesar das diferenças ideológicas, ele observa que “americanos e chineses são fundamentalmente parecidos: inquietos, ansiosos por atalhos, impulsionando a maioria das grandes mudanças do mundo” e conclui “Que sua rivalidade não deve ser raciocinada com termos desgastados do século passado, como socialista, democrático ou neoliberal. E que ambos os países são emaranhados de imperfeição, entregando regularmente – em nome da competição – auto-espancamentos que vão além dos sonhos mais loucos do outro.”

Crescer na periferia me dotou de maior ceticismo em relação às glórias estatais que Pequim escolhe celebrar e maior relutância em participar da cultura competitiva comum em Xangai ou Shenzhen.

Essas ideias ganham vida nas palavras do autor. Em seu relato de uma viagem de bicicleta de Guiyang a Chongqing em 2021, Wang destaca que, mesmo sendo a quarta província mais pobre da China, “tem uma infraestrutura muito melhor que a Califórnia ou Nova York, ambas mais ricas por ordens de magnitude”. Ele vê nisso um reflexo do “socialismo com características chinesas”, mas alerta que o foco em engenharia social, como a política do filho único, “desanda feio”, com brutalidades como “esterilizações em massa e abortos forçados” que marcaram uma “campanha de terror rural”. Nos EUA, ele critica a transformação em uma “vetocracia litigiosa”, onde “a dominância de advogados na elite ajudou a criar um sistema que funciona bem principalmente para os ricos e bem conectados”, sugerindo que “a América não pode permanecer uma grande potência” se continuar assim. Curiosamente, Wang traz uma perspectiva única como alguém nascido no Canadá, com raízes em Yunnan, na China, onde viveu de 2017 a 2023. Essa dualidade cultural o leva a reflexões intrigantes sobre emigração e legado, como quando ele pondera se seus ancestrais teriam ficado na China se vissem o que ela se tornaria – uma nação que, em suas palavras, “construiu muitas milhas de estradas, novas usinas nucleares e toneladas de aço nas últimas quatro décadas”, mas às custas de liberdades individuais.

O domínio dos advogados na elite americana ajudou a transmutar os Estados Unidos em uma vetocracia litigiosa. Acredito que a América não pode continuar sendo uma grande potência se estiver tão comprometida com um sistema que funcione bem principalmente para os ricos e bem conectados.

O estado de engenharia versus a sociedade jurídica não é uma grande teoria para explicar absolutamente tudo sobre os EUA e a China. Em vez disso, o livro está enraizado em minhas próprias experiências de vida na China de 2017 a 2023. Eu ofereço essa estrutura para dar sentido ao passado recente e pensar sobre o que pode vir a seguir.

Ajuda a explicar uma série de coisas. Por exemplo, a guerra comercial e o confronto tecnológico. Os EUA confiaram em legalismos – cobrando tarifas e projetando um regime de sanções cada vez mais requintado – enquanto a China se concentrou em criar o futuro construindo fisicamente carros melhores, cidades mais bonitas e usinas de energia maiores. Embora a China tenha construído estradas e pontes no exterior, ela luta para inspirar o apelo cultural global, porque os engenheiros não falam mansamente e tendem a censurar tudo o que não conseguem entender. O Estado chinês às vezes é racional demais, seguindo um caminho que parece perfeitamente lógico, até que a maior cidade do país fica repentinamente em estado de bloqueio por meses.

Socialmente, Wang revela facetas inesperadas de sua jornada. Durante sua estadia na China, ele não apenas analisou economias e infraestrutura, mas também se integrou a comunidades locais, observando como “os chineses comuns incorporam um saber-fazer” que vai além das fábricas – uma habilidade que ele associa à competitividade nacional. Sua decisão de viajar de bicicleta, enfrentando estradas precárias e climas extremos, reflete uma curiosidade quase antropológica, culminando em encontros que o fizeram questionar se a “inquietude chinesa” não seria um espelho da americana. Além disso, como fellow de pesquisa no Hoover History Lab, na Universidade de Yale, Wang traz uma lente acadêmica, mas com um toque pessoal: suas cartas anuais sobre a China, que evoluíram para este livro, mostram um homem que mistura dados econômicos com histórias de vida, como a de trabalhadores rurais que ele conheceu e que “vivem para construir, mesmo sem saber o porquê”. Essa conexão humana adiciona profundidade, destacando como a engenharia chinesa não é apenas técnica, mas um fenômeno social enraizado na cultura (já falamos sobre a abertura de mercado na china aqui).

Essa narrativa ganha um novo contorno ao olhar para o Brasil. Diferente da China, que canalizou sua energia em infraestrutura e industrialização, o Brasil luta para sair do atoleiro do subdesenvolvimento. A baixa produtividade é um entrave central, com trabalhadores e empresas rendendo menos que pares em nações emergentes, agravada por uma escolaridade mediana que deixa grande parte da população sem qualificação para empregos de maior valor (já falamos sobre a desigualdade brasileira). A fuga de cérebros drena talentos para países como EUA e Europa, enquanto a corrupção consome bilhões anualmente em desvios e má gestão (já falamos sobre isso aqui). A economia fechada, dependente de commodities e com barreiras ao comércio, limita a diversificação, e a armadilha da renda média prende o país em crescimento lento, incapaz de competir globalmente (já falamos sobre isso aqui).

A industrialização, que Wang vê como motor da ascensão chinesa, nunca decolou plenamente no Brasil. Investimentos em infraestrutura são engolidos por disputas judiciais e falta de planejamento, ecoando a “sociedade advogada” americana, mas sem os recursos para superar os entraves. A baixa escolaridade perpetua a desigualdade, e a pressão da renda média reflete a incapacidade de avançar para economias de alto valor. Comparado à China, que, nas palavras de Wang, “construiu muitas milhas de estradas, novas usinas nucleares e toneladas de aço nas últimas quatro décadas”, o Brasil parece paralisado por ineficiência e desinteresse político em reformas. Wang sugere que industrialização pode levar a mudanças sociais, como em Coreia do Sul e Singapura – um caminho que o Brasil ainda não encontrou (jã falamos sobre isso aqui). Para prosperar, o país precisaria combater a corrupção, abrir sua economia e investir em educação, aprendendo da engenharia chinesa e do pluralismo ocidental, equilibrando os extremos que Wang observa nos dois gigantes globais.

O livro você pode encontrar na Amazon

Mais detalhes: Breakneck Divide: China’s Builders Vs America’s Lawyers / Breakneck: China’s Quest to Engineer the Future | Dan Wang / While China Builds, America Litigates – The Atlantic / What the US Can Learn from Engineering in China – Bloomberg

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