‘Por Que as Nações Fracassam?’ Uma análise do Brasil à luz do livro de Acemoglu e Robinson

Recentemente, voltei a um livro que li há alguns anos e que, agora, com a notícia de que os autores Daron Acemoglu e James Robinson – além de Simon Johnson – ganharam o Prêmio Nobel de Economia em 2024 (noticia oficial aqui), parece mais atual do que nunca: Por Que as Nações Fracassam. Confesso que, como servidor público, me vi instigado a reler essa obra com uma nova perspectiva, pensando especialmente no contexto brasileiro e nas nossas instituições. Afinal, o que realmente faz uma nação prosperar ou, pelo contrário, fracassar? E por que o Brasil parece estar sempre num ciclo de altos e baixos?

A Teoria Central: Instituições Inclusivas vs. Extrativas

A tese central do livro é relativamente simples, mas poderosa: o sucesso ou fracasso de uma nação está diretamente relacionado à natureza de suas instituições. Acemoglu e Robinson argumentam que são as instituições políticas e econômicas que definem se uma sociedade será próspera ou não. Eles dividem essas instituições em dois tipos: inclusivas e extrativas.

Instituições inclusivas são aquelas que permitem a participação de toda a sociedade no processo econômico e político. Elas incentivam a inovação, o empreendedorismo e a concorrência. São aquelas que, segundo o economista Schumpeter, permitem que a “destruição criativa” (já escrevemos sobre a teoria aqui) – onde novas ideias substituem as antigas – aconteça. Instituições inclusivas, então, são as que proporcionam estabilidade e crescimento sustentado.

Por outro lado, as instituições extrativas são aquelas que servem a uma elite, que exploram a maioria da população para concentrar poder e riqueza em um pequeno grupo. Na visão dos autores, é isso que faz com que muitas nações não consigam avançar. Elas estão presas a essas estruturas extrativas que tiram recursos, capacidade de inovação e esperança de uma sociedade inteira. E é difícil não lembrar do Brasil quando falamos de instituições extrativas. Será que estamos presos a esse ciclo?

E a América Latina, Onde Entra Nisso?

O livro traz vários exemplos de como as instituições moldaram o desenvolvimento de países ao longo da história. Quando Acemoglu e Robinson analisam a América Latina, a perspectiva não é exatamente animadora. Eles descrevem como a colonização na região foi marcada pela criação de instituições extrativas, voltadas para exploração de recursos e mão de obra. Esses modelos coloniais deixaram um legado que, mesmo com a independência, se perpetuou em muitos países latino-americanos.

E o Brasil? Bem, sabemos que o nosso passado também foi marcado pela escravidão e por uma economia de plantation, onde a concentração de terras e poder nas mãos de poucos se consolidou. Mesmo após a independência, esses valores acabaram sendo refletidos nas nossas instituições. Passamos de um Império a uma República, mas a estrutura de poder manteve muitos dos traços da velha ordem. Isso ajudou a cristalizar práticas extrativas que vemos até hoje. Afinal, quantos dos nossos problemas atuais – corrupção, desigualdade e falta de oportunidade – não são reflexos desse passado?

O Brasil de Hoje: Estamos Presos no Ciclo?

Como servidor público, eu vejo de perto as dificuldades que enfrentamos em termos de instituições no Brasil. As leis existem, mas será que elas funcionam? Muitos dos nossos órgãos de fiscalização e controle, por exemplo, têm dificuldade em atuar de maneira efetiva. A corrupção e a burocracia criam obstáculos que, em vez de resolver problemas, muitas vezes apenas os empurram para debaixo do tapete. A leitura do livro me fez refletir sobre o quanto nossas instituições parecem mais extrativas do que inclusivas.

Quantas vezes nós, como sociedade, vemos casos de corrupção que acabam não tendo uma resolução? Quem se beneficia de um sistema em que o Estado muitas vezes serve aos interesses de um pequeno grupo em detrimento da população? O livro coloca que, para que uma nação prospere, é essencial que as instituições sejam fortalecidas e atuem em prol de todos. Isso me leva a perguntar: o Brasil tem capacidade de transformar suas instituições? Podemos tornar nossas políticas mais inclusivas, ou estamos presos num ciclo sem fim?

As Lições do Livro: Existe Esperança?

Apesar do tom do livro, que por vezes pode parecer pessimista, Acemoglu e Robinson também apontam que as mudanças são possíveis. Eles ressaltam que não é uma questão de “determinismo histórico” – as nações não estão condenadas a fracassar. Países que um dia tiveram instituições extrativas podem transformá-las. Isso exige uma combinação de pressão popular, reformas institucionais e, muitas vezes, uma ruptura com as práticas do passado.

Pensando no Brasil, vejo que essa transformação é possível, mas não fácil. Muitas vezes, as pessoas se sentem impotentes diante da grandiosidade do problema. No entanto, o livro sugere que é justamente em momentos de crise que as maiores oportunidades de mudança aparecem. Será que o Brasil está próximo de uma dessas oportunidades? A história recente mostra que houve avanços importantes, como a maior transparência em órgãos públicos e leis mais rígidas de combate à corrupção. Mas, ao mesmo tempo, também vemos retrocessos e tentativas de enfraquecer o que foi conquistado.

Recepção e Críticas ao Livro: O Que Economistas e Especialistas Têm a Dizer

A teoria central de Acemoglu e Robinson, que coloca as instituições no centro do sucesso ou fracasso das nações, recebeu muitos elogios, mas também foi alvo de críticas e questionamentos de outros especialistas.

Uma das principais críticas ao livro vem de economistas que argumentam que Acemoglu e Robinson dão pouca atenção a fatores como a geografia e a cultura. Por exemplo, Jared Diamond, autor de Armas, Germes e Aço (já escrevemos sobre o livro aqui), argumenta que aspectos geográficos desempenham um papel crucial no desenvolvimento econômico, influenciando a disponibilidade de recursos naturais e a facilidade de acesso a mercados. Para Diamond, ignorar a geografia e focar exclusivamente nas instituições pode oferecer uma visão incompleta das razões pelas quais algumas nações prosperam enquanto outras falham.

Outros especialistas, como o economista Jeffrey Sachs, levantam a questão da interdependência econômica global. Sachs, por exemplo, acredita que os autores subestimam o impacto das políticas internacionais e das condições externas no desenvolvimento de um país. Ele aponta que países de baixa renda muitas vezes enfrentam barreiras impostas por nações mais ricas e pelo sistema financeiro internacional, que limitam suas oportunidades de crescimento.

Apesar dessas críticas, muitos consideram que a abordagem de Acemoglu e Robinson oferece uma estrutura valiosa para pensar o desenvolvimento econômico. Paul Krugman, outro ganhador do Prêmio Nobel de Economia, reconheceu a importância do livro e afirmou que ele levanta questões fundamentais sobre a relação entre política e economia. Krugman, no entanto, pondera que, embora a teoria institucional seja poderosa, ela não deve ser tratada como a única explicação para o desenvolvimento econômico.

No cenário brasileiro, o livro também gerou reflexões. Especialistas daqui apontam que a teoria ajuda a explicar as falhas institucionais do Brasil, mas ponderam que a corrupção e as práticas extrativistas são sintomas de um problema mais profundo e não causas isoladas. A combinação de várias questões estruturais, políticas e econômicas cria um quadro complexo e multidimensional que, segundo alguns, o livro aborda de forma simplificada.

Mesmo com os debates, é inegável que o livro trouxe uma nova perspectiva para entender o desenvolvimento e o subdesenvolvimento, destacando a importância das instituições e o papel fundamental que elas desempenham na construção de uma sociedade próspera e justa. O livro continua sendo uma referência central no campo da economia e política, especialmente para quem, como eu, busca entender e analisar criticamente a realidade de países com desafios complexos, como o Brasil.

Refletindo Sobre o Futuro

Por que algumas nações conseguem romper com o ciclo de instituições extrativas e outras não? Essa leitura me faz pensar que precisamos, como sociedade, de uma mobilização para reformar as nossas instituições. Se o Brasil quiser realmente prosperar, não basta investir em infraestrutura ou apenas em crescimento econômico. Precisamos, acima de tudo, de instituições que sirvam à população, e não apenas a uma elite.

O Brasil, com sua vasta extensão territorial, riquezas naturais e diversidade cultural, possui um potencial imenso. No entanto, como o livro nos mostra, o sucesso de uma nação não depende apenas de seus recursos, mas principalmente de como suas instituições os gerenciam e distribuem.

Olhando para o futuro, vejo alguns caminhos possíveis:

  1. Persistência das instituições extrativas: Se mantivermos o status quo, corremos o risco de perpetuar as desigualdades e limitar nosso desenvolvimento. Isso poderia resultar em uma estagnação econômica e social a longo prazo.

  2. Transição gradual para instituições mais inclusivas: Este cenário envolveria reformas progressivas em nossas estruturas políticas e econômicas. Poderíamos ver melhorias graduais na distribuição de oportunidades e recursos, embora o processo possa ser lento e enfrentar resistências.

A questão que fica é: qual desses caminhos seguiremos? E mais importante, qual é o nosso papel nessa escolha?

E você, como vê o futuro do Brasil à luz dessas reflexões? Que papel você acredita que pode desempenhar na construção de instituições mais inclusivas em nosso país?

Leituras complementares:

Por que as nações fracassam (wikipedia.org)

Prémio de Ciências Económicas 2024 – Comunicado de imprensa – NobelPrize.org

Vista do Instituições e prosperidade – Revista de Graduação e Pós-Graduação em Ciências Sociais (pucrs.br)

Vista do Por que as nações fracassam: as origens da riqueza, da prosperidade e da pobreza (pucsp.br)

Por que o Brasil encalhou? Veja a resposta do autor de ‘Por que as Nações Fracassam’ – Brazil Journal

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