FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA

A História da Força Expedicionária Brasileira (FEB)

Quando pensamos na Segunda Guerra Mundial, é comum imaginar as grandes batalhas travadas na Europa ou no Pacífico, mas talvez poucos saibam que o Brasil também teve uma participação significativa nesse conflito. A Força Expedicionária Brasileira (FEB) foi o grupo de soldados enviados para lutar ao lado dos Aliados na Itália. Porém, o que levou o Brasil, um país distante do epicentro da guerra, a se envolver no maior conflito da história moderna? A resposta passa por ataques de submarinos alemães, interesses econômicos e a geopolítica global.

A Entrada do Brasil na Guerra: O Ataque aos Navios Brasileiros

A entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial não foi uma decisão imediata. No início do conflito, Getúlio Vargas, então presidente, adotava uma posição de neutralidade. Em 1939, quando a guerra estourou na Europa, o Brasil buscava manter boas relações tanto com os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão) quanto com os Aliados (liderados por Estados Unidos, Reino Unido e União Soviética). Getúlio estava ciente da importância de agradar ambos os lados, especialmente por questões comerciais, já que o Brasil exportava para ambos os blocos.

Contudo, essa neutralidade começou a ser desafiada quando submarinos alemães, os famosos U-boats, passaram a atacar navios brasileiros. Mas por que os nazistas começaram a atacar o Brasil? A resposta está na crescente proximidade entre o Brasil e os Estados Unidos. Na medida em que o conflito avançava, o Brasil passou a fornecer recursos estratégicos para os Aliados, em especial, para os norte-americanos, e começou a permitir o uso de suas bases aéreas no nordeste brasileiro para operações militares. Isso enfureceu a Alemanha, que passou a considerar o Brasil como um aliado informal dos Estados Unidos.

Entre 1941 e 1942, submarinos alemães afundaram diversos navios brasileiros, o que culminou com o famoso “Agosto de 1942”, quando cinco navios mercantes brasileiros foram afundados no espaço de apenas três dias. Esses naufrágios ocorreram no Atlântico, na costa brasileira, em locais como o litoral de Sergipe, onde o navio “Baependi” foi afundado, e nas proximidades de Aracaju, onde o navio “Araraquara” foi atacado. No total, mais de 600 civis brasileiros perderam a vida nesses ataques.

A frase “Mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil ir para a guerra” era repetida com descrença antes do envio das tropas. Essa expressão popular, que indicava algo quase impossível, acabou inspirando o símbolo da FEB: uma cobra fumando. E essa “cobra fumou” de verdade, com coragem e determinação, desafiando todas as expectativas.

Esses eventos foram a gota d’água para a população brasileira. As notícias de navios brasileiros sendo atacados e afundados por submarinos nazistas dominaram as manchetes dos jornais da época. A indignação popular cresceu rapidamente, com protestos e manifestações nas ruas. O sentimento de revolta foi generalizado, e até mesmo a resistência interna ao envolvimento do Brasil na guerra foi superada. Esse contexto levou Getúlio Vargas a declarar guerra à Alemanha e à Itália no dia 22 de agosto de 1942.

A Posição dos EUA e o Intercâmbio Econômico com o Brasil

Os Estados Unidos, liderados por Franklin D. Roosevelt, viram no Brasil um aliado estratégico não só pela localização geográfica, mas também pelos recursos que o país poderia oferecer. Um dos recursos mais valiosos para os Estados Unidos durante a guerra era a borracha, essencial para a produção de pneus, equipamentos militares e veículos. Antes do conflito, grande parte da borracha usada pelos EUA vinha da Ásia, especialmente de regiões controladas por potências como o Japão. Quando o Japão expandiu suas operações e passou a controlar grande parte do Sudeste Asiático, os Estados Unidos se viram em uma situação desesperadora. Onde conseguiriam a borracha necessária para o esforço de guerra?

Foi aí que o Brasil entrou em cena. A Amazônia, com suas vastas florestas de seringueiras, se tornou uma das fontes principais de borracha para os Aliados. Os “Soldados da Borracha”, como ficaram conhecidos os seringueiros enviados para a Amazônia, desempenharam um papel crucial nesse esforço. Homens foram recrutados, principalmente no nordeste do Brasil, para trabalhar na extração de látex das seringueiras e enviar toneladas de borracha para os Estados Unidos.

Mas essa operação logística e industrial não aconteceu por acaso. Os EUA enviaram representantes ao Brasil para garantir o sucesso dessa parceria. Um dos nomes mais importantes foi Nelson Rockefeller, então chefe da Office of the Coordinator of Inter-American Affairs (CIAA). Ele foi fundamental para o fortalecimento das relações entre Brasil e EUA durante a guerra, promovendo a cooperação econômica e industrial entre os dois países. Rockefeller e sua equipe trabalharam para garantir que o Brasil aumentasse sua produção de borracha e outros recursos estratégicos. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos apoiaram o Brasil com financiamento e recursos técnicos para modernizar a infraestrutura do país.

O governo de Getúlio Vargas também aproveitou esse momento para negociar com os EUA investimentos em setores-chave da economia brasileira. Foi durante esse período que a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) foi criada, com o apoio dos americanos. A CSN, localizada em Volta Redonda (RJ), foi fundamental para a industrialização do Brasil e produziu aço, outro recurso crítico para o esforço de guerra dos Aliados.

A Importância da FEB e o Desempenho dos Brasileiros no Exterior

Com a declaração de guerra feita em 1942, o Brasil começou a preparar suas tropas para serem enviadas ao front. Nascia a Força Expedicionária Brasileira (FEB). A FEB lutou ao lado dos Aliados, especialmente na Campanha da Itália, e foi crucial na libertação de cidades como Monte Castello e Montese, durante 1944 e 1945.

Os soldados brasileiros eram em sua maioria jovens de origem humilde, muitos dos quais nunca tinham saído de suas regiões no Brasil. De repente, encontraram-se em um cenário de guerra europeu, lutando ao lado de tropas americanas, inglesas e outras nações aliadas. Como mencionei antes, o símbolo da FEB, a cobra fumando, foi uma resposta irônica ao ceticismo de muitos que diziam que seria mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil ir à guerra.

Curiosamente, apesar das dificuldades, os soldados brasileiros ganharam o respeito de seus colegas aliados. As tropas da FEB foram essenciais em momentos decisivos, como na tomada de Monte Castello, uma vitória que desbloqueou a rota dos Aliados para avançar no norte da Itália. Além disso, a FEB teve um desempenho notável ao capturar prisioneiros alemães, cerca de 20 mil soldados inimigos foram capturados pelas tropas brasileiras.

Os jornais no Brasil acompanharam de perto o desempenho dos brasileiros no exterior, e a FEB virou motivo de orgulho nacional. Fotografias de soldados brasileiros ao lado de tropas americanas e britânicas circularam pela mídia, reforçando o papel do Brasil na guerra.

Memórias Brasileiras na Itália: Monumentos e Homenagens à FEB nas Cidades Italianas

Mesmo décadas após o fim da Segunda Guerra Mundial, o Brasil ainda é lembrado com carinho e respeito em algumas regiões da Itália, especialmente onde a Força Expedicionária Brasileira (FEB) deixou sua marca. Em cidades como Montese, Monte Castello e Fornovo di Taro, a presença dos soldados brasileiros é celebrada através de placas, monumentos e homenagens que mantêm viva a memória do sacrifício e da coragem dos nossos soldados no combate ao fascismo e ao nazismo.

Montese: A Vitória Brasileira na Apeninos

Montese é uma cidade ao norte da Itália, na região dos Apeninos, que se tornou um dos principais pontos de recordação da FEB. Foi lá que, em abril de 1945, as tropas brasileiras lutaram uma das suas batalhas mais intensas, enfrentando resistência ferrenha das forças alemãs. Hoje, a cidade abriga um monumento em homenagem aos soldados da FEB que caíram em combate. A população local celebra, com cerimônias anuais, o papel crucial dos brasileiros na libertação de Montese. É tocante ver como essa pequena cidade ainda reverencia os “pracinhas” brasileiros que ajudaram a trazer a liberdade à região.

Monte Castello: A Cobra Fumou

Monte Castello talvez seja o local mais simbólico para a FEB na Itália. Essa cidade foi palco de uma série de batalhas duras, onde os soldados brasileiros enfrentaram duras condições e conseguiram capturar uma posição estratégica. Após várias tentativas, os brasileiros finalmente conquistaram Monte Castello em 21 de fevereiro de 1945, um feito que se tornou emblemático para a FEB. Hoje, há um monumento em Monte Castello que comemora essa vitória e homenageia os soldados que participaram da batalha. Além disso, há placas com o símbolo da “cobra fumando”, um tributo ao espírito e à determinação dos soldados brasileiros.

Fornovo di Taro: A Rendição Alemã aos Brasileiros

Outra cidade onde a FEB deixou sua marca foi Fornovo di Taro. Aqui, os brasileiros conseguiram uma rendição em massa das tropas alemãs, capturando cerca de 20 mil soldados. Esse foi um feito impressionante, que mostrou a força e a organização dos soldados da FEB. Em Fornovo, existe uma placa de homenagem aos brasileiros, que lembra o impacto decisivo dessa captura para a libertação da região. Os habitantes de Fornovo mantêm a tradição de agradecer aos brasileiros pela ajuda prestada, e até hoje a FEB é vista como uma aliada essencial para a liberdade da cidade.

A Lembrança Viva dos Brasileiros na Itália

Essas cidades italianas, com seus monumentos e homenagens, são uma prova de como o esforço brasileiro durante a Segunda Guerra ainda é reconhecido e valorizado na Europa. Em cada uma dessas regiões, o Brasil é lembrado não apenas por sua participação militar, mas pelo impacto humano e cultural que nossos soldados deixaram por lá. Ver essas homenagens em terras estrangeiras desperta uma sensação de orgulho e, ao mesmo tempo, nos faz refletir sobre a importância de preservar essa memória.

Esses monumentos nos lembram que o Brasil, mesmo a milhares de quilômetros de distância, fez a diferença em um momento crucial para a humanidade. A história da FEB e a presença desses tributos na Itália reforçam o respeito conquistado por nossos soldados e a relevância do Brasil no cenário internacional durante a Segunda Guerra Mundial.

O Legado da FEB e a Política de Vargas Pós-Guerra

Após a guerra, o papel de Getúlio Vargas mudou drasticamente. O presidente, que governou com um estilo autoritário durante o Estado Novo, enfrentou a pressão por uma democratização do Brasil. A ironia? Enquanto o Brasil lutava pela democracia na Europa, internamente, o regime de Vargas mantinha características autoritárias. Depois da guerra, em 1945, Vargas acabou sendo deposto, em parte, por esse contraste entre sua política interna e externa.

A participação na Segunda Guerra mostrou que o Brasil era capaz de mobilizar suas forças e contribuir em um conflito global. Além disso, a FEB ajudou a moldar as relações do Brasil com outras nações, especialmente os Estados Unidos, e influenciou a política nacional nos anos que se seguiram.

A história da FEB é uma daquelas que nos faz pensar: o que teria acontecido se o Brasil não tivesse participado da Segunda Guerra? Como seria nossa relação com o mundo hoje? A participação dos soldados brasileiros no conflito foi uma oportunidade única de projetar o Brasil no cenário internacional que, ao mesmo tempo, trouxe oportunidades de modernização econômica e fortalecimento de laços diplomáticos, especialmente com os Estados Unidos.

Se hoje o Brasil é uma nação mais industrializada, com uma presença mais relevante no cenário global, parte disso se deve às escolhas feitas durante esse período.

Leituras complementares:

Memorial da FEB – A Campanha da Força Expedicionária Brasileira

O Roteiro do Destacamento FEB – Google My Maps

Itamaraty e a Força Expedicionária Brasileira (Livro completo FUNAG)

Notícias:

Batalha de Monte Castello – Wikipédia, a enciclopédia livre

5 em 1: 79 anos da tomada de Monte Castelo – Museu Regional de São João Del Rei

Vitória da FEB, com a tomada de Monte Castello, completa 76 anos — Ministério da Defesa

ORDEM DO DIA – TOMADA DE MONTE CASTELLO – Exército Brasileiro

A conquista de Monte Castello: Honra e Glória da FEB na Itália

Tomada de Monte Castello

Exército Brasileiro prepara evento para relembrar os 80 anos da Força Expedicionária Brasileira (FEB) | Local: Diario de Pernambuco

Há 75 anos, soldados brasileiros derrotaram nazistas na batalha de Monte Castello

Batalha de Montese – Wikipédia, a enciclopédia livre

Montese, a cidade italiana homenageia os heróis da FEB (Força Expedicionária Brasileira)

Exército prestará homenagens na Itália – Notícias – Exército Brasileiro

Militares brasileiros que lutaram na 2ª Guerra ganham homenagem em palco de batalha sangrenta contra Hitler na Itália | Campinas e Região | G1

Cerimônias em homenagem aos heróis da FEB na província italiana de Modena

Oito monumentos italianos em homenagem aos nossos pracinhas | Jornalismo de Guerra

Batalha de Fornovo di Taro – Wikipédia, a enciclopédia livre

Exército comemora 79 anos do cerco de Fornovo di Taro – Notícias – Exército Brasileiro

Batalha em Fornovo Di Taro

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