Soldados armados carregam uma faixa com os dizeres "Comunismo", rua Nikolskaya, Moscou, outubro de 1917. Autor Desconhecido - Original: Russian State Documentary Film and Photo Archive.

A Revolução Russa

Escrever para o site é sempre uma alegria, mas o que me deixa ainda mais empolgado é receber mensagens de quem acompanha os textos. Outro dia, chegaram alguns e-mails de militantes da esquerda brasileira elogiando o texto sobre a Coluna Prestes (você pode ler o texto aqui). Falaram o quanto gostaram e até comentaram que não conheciam muitos detalhes dessa parte da história. Achei isso incrível, porque mostra como até quem milita às vezes deixa passar histórias tão importantes.

Eu mesmo só fui me aprofundar nesse tema na faculdade de Relações Internacionais. E nem foi porque caiu em alguma prova ou aula, mas por curiosidade minha. Foi naquele famoso “deixa eu dar uma olhada nisso aqui” que acabei descobrindo mais sobre a Coluna Prestes e outros momentos marcantes da nossa história. É engraçado como a gente vai conectando os pontos e percebendo que tem sempre mais coisa para aprender sobre o Brasil. Hoje vou trazer um breve resumo sobre a Revolução Russa e a queda do Czarismo.

A Revolução Russa, que começou em 1917, não foi só um dos eventos mais importantes do século XX, mas também um daqueles momentos em que a história parece sair dos trilhos. Foi como um tabuleiro de xadrez onde o rei foi derrubado por peões famintos e descontentes. A Rússia de antes da revolução era praticamente um caldeirão prestes a explodir. E, bom, explodiu. Mas, antes de falarmos sobre os bolcheviques, Lênin e toda a conversa sobre “proletários do mundo, uni-vos”, vamos voltar um pouco no tempo. Afinal, como é que a Rússia chegou nesse ponto?

A Rússia Pré-Revolução: Um Gigante com Pés de Barro

Imagine um país imenso, rico em recursos naturais, mas com uma sociedade extremamente desigual. No início do século XX, a Rússia era um império liderado pelo czar Nicolau II, um homem que, digamos, não tinha o menor jeito para governar. A economia era baseada em agricultura atrasada, enquanto países como Inglaterra e Alemanha já estavam surfando a onda da industrialização.

A sociedade russa era um reflexo cruel dessa desigualdade. De um lado, a aristocracia vivia em um luxo extravagante, organizando bailes e se preocupando com que joias usar. De outro, a maioria da população era composta por camponeses miseráveis, que mal conseguiam sobreviver. A classe trabalhadora nas cidades crescia, mas trabalhava em condições terríveis, com salários baixos e jornadas exaustivas.

E, como se isso não fosse suficiente, a Rússia se envolveu em uma série de desastres políticos e militares. A derrota humilhante para o Japão na Guerra Russo-Japonesa (1904-1905) foi um golpe no orgulho nacional. E, claro, a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) foi a cereja do bolo do caos. O exército russo era mal equipado, mal treinado e comandado por uma elite incompetente. Não é à toa que o povo começou a perguntar: “Por que estamos morrendo por uma guerra que nem entendemos direito?”

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1917: O Ano em que Tudo Mudou

E então, veio 1917. Primeiro, tivemos a Revolução de Fevereiro, que derrubou o czar Nicolau II. Foi um momento de esperança: “Agora vai!” – pensaram muitos russos. Um governo provisório foi estabelecido, liderado por Aleksandr Kerensky. Mas, se você acha que a transição seria suave, está muito enganado. O governo provisório teve diversos problemas. Ele tentava governar, mas não tinha apoio suficiente nem conseguia resolver os problemas urgentes, como a fome e a continuação da guerra. Na sequencia veio a segunda revolução, a Revolução de Outubro.

E é aí que entram os bolcheviques, liderados por Vladimir Lênin. Com sua frase de efeito “paz, terra e pão”, ele conseguiu conquistar os corações e mentes do povo. E, vamos combinar, quem não quer essas três coisas? Em outubro de 1917, os bolcheviques tomaram o poder em um golpe quase teatral, derrubando o governo provisório. Nascia a União Soviética, e a Rússia nunca mais seria a mesma.

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A Promessa de um Mundo Novo

Os bolcheviques chegaram ao poder com promessas grandiosas. Eles queriam acabar com a exploração, redistribuir terras e dar poder ao povo. Era o fim do czarismo e do capitalismo, e o início de uma sociedade socialista. Mas, como muitas vezes acontece com as promessas políticas, a realidade foi bem diferente.

Do ponto de vista econômico, os primeiros anos foram caóticos. Lênin implementou o “comunismo de guerra” durante a Guerra Civil Russa (1917-1923), uma política que basicamente confiscava alimentos dos camponeses para abastecer as cidades e o exército. Resultado? Fome, mais fome e revoltas. Milhões morreram, e a economia praticamente colapsou.

Socialmente, as mudanças foram profundas. A aristocracia foi desmantelada, e o proletariado urbano ganhou protagonismo. Mas será que o povo realmente ganhou poder? Não exatamente. O Partido Comunista centralizou o controle de forma brutal, e qualquer dissidência era rapidamente esmagada. É curioso (e triste) pensar como um movimento que prometia liberdade acabou instaurando um regime autoritário.

Mais detalhes: Comunismo de guerra – Wikipédia

A Geopolítica da Revolução

Geopoliticamente, a Revolução Russa foi um terremoto. Ela assustou as potências ocidentais, que temiam que o comunismo se espalhasse como uma praga. E, bem, em parte foi o que aconteceu. Movimentos comunistas em outros países começaram a ganhar força, inspirados pelo sucesso bolchevique.

Mas a Rússia soviética também ficou isolada. A Guerra Civil Russa foi um dos momentos mais caóticos da história moderna, com forças “brancas” (contrarrevolucionárias) lutando contra os “vermelhos” (bolcheviques), enquanto potências estrangeiras como Reino Unido, França, Japão e Estados Unidos intervinham tentando esmagar o movimento comunista.

Mesmo assim, a União Soviética conseguiu se consolidar. Mas a que custo? Milhões de mortos, uma economia devastada e um regime que logo se tornaria sinônimo de autoritarismo.

Melhorias? Sim e Não

Agora, a pergunta que não quer calar: a Revolução Russa trouxe melhorias econômicas e sociais? A resposta depende de para quem você pergunta.

Por um lado, a União Soviética, nas décadas seguintes, conseguiu modernizar a economia, industrializar o país e alfabetizar grande parte da população. Do ponto de vista do desenvolvimento econômico, o regime soviético conseguiu feitos impressionantes, especialmente sob Stalin (apesar dos métodos questionáveis, como os planos quinquenais e a coletivização forçada).

Por outro lado, essas conquistas vieram a um custo humano altíssimo. A repressão política, os expurgos, os gulags e as perseguições criaram um ambiente de medo constante. A promessa de liberdade e igualdade se perdeu em meio ao autoritarismo e ao controle absoluto do Partido Comunista.

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O Governo Bolchevique: Entre Promessas e Realidade

Depois da Revolução Russa de 1917, os bolcheviques assumiram o controle e prometeram uma transformação radical no funcionamento do governo e na vida do povo. Mas, como muitas vezes acontece, as ideias no papel eram bem diferentes da realidade na prática. Vamos entender como funcionava esse novo governo, quais eram suas prioridades e o que eles realmente conseguiram entregar à população.

Como Funcionava o Governo Bolchevique?

Os bolcheviques estabeleceram um governo centralizado e altamente autoritário. Logo de cara, dissolveram a Assembleia Constituinte, uma instituição eleita democraticamente que representava uma ampla gama de forças políticas. Por quê? Bem, a Assembleia tinha maioria menchevique e socialista-revolucionária, dois grupos que discordavam da visão bolchevique. Então, para Lênin e seus camaradas, não fazia sentido manter algo que não seguia a cartilha revolucionária.

No lugar da democracia parlamentar, eles implantaram o sistema dos sovietes – conselhos de trabalhadores, soldados e camponeses que, teoricamente, representariam os interesses do povo. Na prática, os sovietes foram rapidamente subordinados ao Partido Comunista, que passou a exercer o controle absoluto.

A máquina pública também foi completamente reformulada. A burocracia czarista foi desmontada, e o Partido Comunista assumiu o comando de todos os aspectos do governo. Era como se cada setor da vida pública – economia, justiça, educação – tivesse um “comissário” do partido para garantir que as decisões estivessem alinhadas com os ideais socialistas.

Mas, aqui vai um detalhe importante: muitos dos novos administradores bolcheviques não tinham experiência ou preparo. Imagine colocar um padeiro para gerenciar uma fábrica de tanques. A vontade de mudar era grande, mas a falta de habilidade muitas vezes gerava mais problemas do que soluções.

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Quais Eram as Prioridades?

As prioridades do governo bolchevique eram claras, pelo menos no discurso. As principais propostas eram:

Paz: A Rússia precisava sair da Primeira Guerra Mundial, que devastava o país e consumia recursos. Foi por isso que, em 1918, os bolcheviques assinaram o Tratado de Brest-Litovsk com a Alemanha, aceitando perdas territoriais significativas em troca do fim do conflito. A decisão foi polêmica, mas indispensável para manter o foco interno.

Terra: Redistribuir terras dos grandes proprietários para os camponeses era uma das principais promessas. E, de fato, as propriedades da aristocracia e da Igreja foram confiscadas e divididas. Porém, isso nem sempre trouxe estabilidade. Muitos camponeses ainda enfrentaram condições precárias e a fome continuou sendo uma ameaça constante.

Pão: Resolver a crise de abastecimento e garantir comida para a população era outra prioridade. Mas, com a Guerra Civil Russa (1917-1923) e a política do “comunismo de guerra”, essa promessa se tornou quase impossível de cumprir.

Mais detalhes: Tratado de Brest-Litovski – Wikipédia

O Comunismo de Guerra: Controle Absoluto em Tempos de Crise

Durante a Guerra Civil, o governo bolchevique implementou o “comunismo de guerra”, um conjunto de medidas drásticas para manter o controle sobre a economia e a sociedade. Entre elas:

Confisco de alimentos: O governo requisitava alimentos dos camponeses para abastecer as cidades e o exército. Isso gerou revoltas camponesas e, ironicamente, aumentou a fome, pois muitos agricultores deixaram de plantar o suficiente.

Nacionalização das indústrias: Todas as grandes empresas foram controladas pelo Estado, que centralizava a produção e a distribuição. Na teoria, isso deveria garantir eficiência. Na prática, a desorganização era enorme.

Proibição do mercado privado: Pequenos comerciantes e produtores foram proibidos de vender seus produtos. Isso levou ao surgimento de mercados clandestinos e ao colapso da economia formal.

O resultado foi catastrófico. A produção agrícola e industrial despencou, milhões morreram de fome, e a insatisfação crescia. Os bolcheviques mantinham o poder graças à força militar e ao controle absoluto, mas o preço social era altíssimo.

Mais detalhes: Comunismo de guerra – Wikipédia / Os bolcheviques e o Comunismo de Guerra

O Que Foi Prometido e o Que Foi Entregue

Os bolcheviques prometiam uma sociedade igualitária, onde a exploração seria abolida e todos teriam acesso às riquezas produzidas. Mas o que foi entregue?

Redistribuição de terras: De fato, as terras foram redistribuídas, mas a coletivização forçada nos anos seguintes trouxe de volta a insatisfação dos camponeses.

Indústria e emprego: A indústria foi nacionalizada, mas a falta de organização e o caos econômico dos primeiros anos geraram desemprego e pobreza generalizada.

Educação e saúde: Aqui, houve avanços reais. O governo investiu em campanhas de alfabetização e expandiu o acesso à educação e à saúde pública. Mas os resultados vieram com o tempo, e os primeiros anos foram marcados por escassez e dificuldades.

O Gerenciamento da Máquina Pública

Uma das características mais marcantes do governo bolchevique era o controle absoluto do Partido Comunista sobre a máquina pública. Não havia separação entre o partido e o Estado. Cada decisão passava pelo comitê central, e a hierarquia partidária ditava os rumos do país.

Esse modelo permitiu decisões rápidas, mas eliminou qualquer forma de oposição ou debate. A dissidência era tratada com repressão, seja através do temido Exército Vermelho, comandado por Leon Trotsky, seja pela Tcheka, a polícia secreta que perseguiu inimigos reais e imaginários do regime.

Mais detalhes: Leon Trótski – Wikipédia / Tcheka – Wikipédi

A Realidade por Trás das Promessas

Se olharmos para os primeiros anos do governo bolchevique, vemos uma mistura de idealismo e pragmatismo brutal. Eles tinham uma visão de futuro, mas muitas vezes usaram métodos extremos para alcançá-la. O que fica claro é que a Revolução Russa não foi apenas uma mudança de governo; foi uma reviravolta completa na sociedade russa, que trouxe avanços em alguns aspectos e tragédias em muitos outros.

Será que os bolcheviques realmente acreditavam que poderiam criar o “paraíso do proletariado” ou sabiam que estavam apenas trocando um tipo de opressão por outro? A história, como sempre, tem sua maneira de complicar as respostas.

Foi Uma Revolução Bem-Sucedida?

Essa é a pergunta de um milhão de rublos. Se olharmos para o impacto imediato, é difícil chamar a Revolução Russa de um sucesso completo. A Rússia passou por anos de sofrimento, repressão e conflitos internos. Mas, a longo prazo, ela moldou o século XX de maneira inegável. A União Soviética emergiu como uma superpotência, mas o custo humano e social foi altíssimo.

Então, foi um movimento libertador ou apenas a troca de uma forma de opressão por outra? Depende de quem você perguntar. Para alguns, a revolução representou uma esperança de igualdade. Para outros, foi uma catástrofe que trouxe décadas de autoritarismo. Para mim, foi um pouco de ambos – uma mistura de promessas grandiosas e consequências brutais.

No fim, a Revolução Russa é uma aula de história e política. Ela nos mostra como mudanças radicais podem transformar sociedades, mas também como essas transformações podem trazer novos desafios. E, acima de tudo, ela nos lembra que, quando um povo é empurrado ao limite, revoluções não são apenas possíveis – elas são inevitáveis.

Ela deu origem a um dos regimes mais influentes (e polêmicos) do século XX, que moldou a geopolítica global até o colapso da União Soviética em 1991. Ela também levantou questões importantes sobre justiça social, poder e desigualdade, que continuam relevantes até hoje.

Vamos refletir; será que o sonho bolchevique de uma sociedade igualitária era impossível desde o início? Ou será que foi sabotado pelas circunstâncias, pelos líderes ou pela própria natureza humana? É difícil responder. Mas uma coisa é certa; a Revolução Russa nos lembra que mudanças profundas, embora necessárias, nem sempre trazem as soluções que prometem. E talvez seja isso que a história nos ensina: a utopia é sempre mais difícil de alcançar do que parece no papel.

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