A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) transformou o mundo de maneiras profundas, e o Brasil, embora inicialmente neutro, acabou se tornando um aliado crucial dos Estados Unidos e das potências Aliadas. Nesse contexto, a cidade de Natal, no Rio Grande do Norte, emergiu como um ponto estratégico fundamental. Localizada no “bojo nordestino” do Brasil, Natal foi apelidada de “Trampolim da Vitória” pelo presidente norte-americano Franklin D. Roosevelt, devido à sua posição geográfica única, que facilitava operações militares transatlânticas. Neste texto, exploraremos a importância histórica e estratégica de Natal, destacando o papel das bases americanas e a cooperação bilateral. Ampliaremos os detalhes históricos, com foco na parceria Brasil-EUA.
O Contexto Histórico da Participação Brasileira na Guerra

O Brasil manteve neutralidade inicial sob o regime de Getúlio Vargas, mas eventos como o ataque japonês a Pearl Harbor em 1941 e os afundamentos de navios brasileiros por submarinos alemães em 1942 mudaram o rumo. Em 28 de janeiro de 1942, durante a Terceira Reunião de Chanceleres das Américas no Rio de Janeiro, o Brasil rompeu relações diplomáticas com as potências do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Em agosto do mesmo ano, declarou guerra após o afundamento de 19 navios mercantes brasileiros, resultando em centenas de mortes. Essa decisão foi impulsionada por pressões populares e pela necessidade de proteção às rotas marítimas atlânticas.
De acordo com fontes do governo americano, como o guia da Library of Congress sobre relações Brasil-EUA durante a guerra, o Brasil se tornou o único país latino-americano a enviar tropas de combate para a Europa, com a Força Expedicionária Brasileira (FEB) (já falamos sobre o tema aqui) atuando na campanha italiana a partir de 1944. A FEB, composta por cerca de 25.000 homens sob o comando do general Mascarenhas de Moraes, lutou em batalhas como Monte Castello e capturou milhares de prisioneiros alemães, contribuindo para a vitória aliada na Itália. Historiadores como Frank D. McCann, em obras sobre a aliança brasileiro-americana (1937-1945), destacam que o envolvimento brasileiro foi facilitado por negociações intensas, incluindo promessas de assistência militar e econômica dos EUA para equipar as forças brasileiras.
Do lado brasileiro, documentos oficiais do governo do Rio Grande do Norte e da Prefeitura de Natal enfatizam que o estado forneceu contribuições decisivas para a vitória aliada, com Natal servindo como base para operações contra o Eixo no Norte da África. Historiadores brasileiros como Luís da Câmara Cascudo, em sua obra “História da Cidade do Natal” (1999), descrevem como a guerra acelerou a urbanização de Natal, dobrando sua população de 55 mil para 100 mil habitantes entre 1940 e 1950, impulsionada pela presença militar estrangeira. Além disso, relatórios da Fundação Nacional das Artes (FUNAG) sobre relações exteriores do Brasil (1939-1950) revelam que o governo Vargas negociou ativamente para maximizar benefícios econômicos, incluindo o fornecimento de matérias-primas como borracha e minérios em troca de tecnologia e investimentos (já retratamos uma passagem dessa historia aqui).
A Estratégia Geográfica de Natal: O “Trampolim da Vitória”

A posição geográfica de Natal foi o fator chave para sua relevância estratégica. Situada no nordeste brasileiro, a cidade é o ponto mais próximo das Américas à África, com distância de apenas cerca de 1.750 milhas marítimas até Dakar, no Senegal. Essa proximidade permitia que aviões e suprimentos fossem enviados rapidamente para o teatro de operações africano e europeu, encurtando rotas e reduzindo riscos de ataques submarinos nazistas. Roosevelt classificou Natal como uma das “quatro áreas mais estratégicas do mundo” durante a guerra, ao lado de pontos como o Canal do Panamá.
Fontes do governo americano, como relatórios da CIA e do Departamento de Estado, destacam que a “protuberância nordestina” do Brasil era vital para controlar o Atlântico Sul e impedir uma invasão alemã, especialmente após a ocupação nazista do Norte da África francesa. O general Dwight Eisenhower, em visita a Natal em 1946, afirmou que a cidade proporcionou “grandes facilidades” aos Aliados, sendo insubstituível para a mobilização. Historiadores como Gerson Moura, no Oxford Research Encyclopedia of Latin American History, argumentam que o Brasil hospedou a maior base aérea americana fora do território dos EUA em Natal, facilitando o transporte aéreo para a África e Europa. Moura enfatiza que essa cooperação foi essencial para a vitória aliada, com o Brasil fornecendo recursos naturais e bases em troca de assistência econômica e militar.
A Parceria Brasil-EUA

A aliança entre Brasil e EUA durante a guerra foi forjada por meio de discussões diplomáticas intensas, iniciadas ainda na neutralidade brasileira. O governo Vargas, ciente da vulnerabilidade do Nordeste, negociou com os EUA para obter garantias de defesa e desenvolvimento econômico. Principais nomes envolvidos incluem Getúlio Vargas (presidente brasileiro), Franklin D. Roosevelt (presidente americano), Oswaldo Aranha (ministro das Relações Exteriores do Brasil) e Sumner Welles (subsecretário de Estado dos EUA). Aranha, em particular, foi muito importante nas negociações, atuando como ponte entre os governos e defendendo interesses brasileiros em reuniões como a Conferência Interamericana de 1942 no Rio de Janeiro. Outros atores chave foram Cordell Hull (secretário de Estado dos EUA) e o embaixador americano no Brasil, Jefferson Caffery, que pressionaram por bases em troca de apoio militar.
O Brasil pediu, principalmente, armamentos modernos, assistência financeira para modernizar suas forças armadas e investimentos em infraestrutura, temendo uma invasão alemã no Nordeste. Em relatórios da FUNAG, é destacado que Vargas condicionou o alinhamento total ao Eixo à garantia de suprimentos via Lend-Lease Act (1941), que permitia aos EUA “emprestar” equipamentos a aliados. Em troca, o Brasil concedeu acesso a bases como Parnamirim, vital para o “Trampolim da Vitória”. Acordos como o de 3 de março de 1942 comprometeram os EUA a transferir armamentos no valor de até 200 milhões de dólares, incluindo tanques, aviões e munições, além de empréstimos para projetos como a Companhia Siderúrgica Nacional (Volta Redonda). O Brasil ganhou não só equipamentos militares (cerca de 75% da ajuda Lend-Lease à América Latina foi para o Brasil), mas também aceleração industrial, com exportações de borracha e minérios impulsionando a economia.
Discussões ocorreram em fóruns como a Conferência do Potengi, em 28 de janeiro de 1943, a bordo do USS Humboldt em Natal, onde Roosevelt e Vargas selaram o envio da FEB e reforçaram a aliança, discutindo defesa hemisférica e pós-guerra. Tensões surgiram, como desconfianças mútuas sobre intenções expansionistas americanas, mas foram resolvidas por meio de diplomacia, com Aranha negociando termos favoráveis.

Os impactos até hoje incluem relações bilaterais fortalecidas, com cooperação em defesa (como acordos militares pós-1945) e influência na criação da ONU, onde o Brasil buscou status de potência. Think tanks como o Wilson Center e o Council on Foreign Relations (CFR) analisam que essa parceria moldou a Política Externa Brasileira, promovendo integração econômica e alianças atuais em áreas como comércio e segurança. No entanto, legados negativos incluem dependência tecnológica inicial e debates sobre soberania.
As Bases Americanas em Natal e a Cooperação Bilateral

Os EUA estabeleceram várias instalações em Natal, com destaque para a Base Aérea de Parnamirim Field, inaugurada em 1942. Construída em parceria com a Pan American Airways e revelada publicamente após o rompimento com o Eixo, Parnamirim se tornou o aeroporto mais movimentado do mundo em 1942, com pousos a cada três minutos e capacidade para 250 aeronaves. A base abrigava 2.500 a 2.700 militares americanos permanentemente e consumia 100.000 litros de gasolina por dia. Além disso, havia a Base Naval no rio Potengi e instalações fluviais para hidroaviões.
Acordos bilaterais, como o Lend-Lease Act de 1941 e o pacto de assistência de 3 de março de 1942, forneceram ao Brasil equipamentos militares e financiamentos, cobrindo 75% da ajuda americana à América Latina. Em troca, o Brasil permitiu o uso de suas bases. Pesquisadores brasileiros como Tarcísio Medeiros (1973) e Antônio Pedro Tota (2000) destacam impactos sociais: a presença americana introduziu o inglês, esportes como basquete e influências culturais via Hollywood, mas também causou racionamento e divisões sociais. Cascudo (1999) relata exercícios de black-out e defesas passivas, com sirenes simulando ataques aéreos.
Curiosidades e Dados Importantes da Época
Natal não foi apenas um hub militar; transformou-se culturalmente. Aqui vão algumas curiosidades:
- Primeira com produtos americanos: Devido à presença de tropas, Natal foi a primeira cidade brasileira a ter Coca-Cola, ketchup, óculos de aviador e calças jeans, introduzidos pelos soldados em 1942.
- Aeroporto mais movimentado: Parnamirim registrou até 50 mil pousos e decolagens mensais em 1943, superando qualquer outro aeroporto global na época.
- Crescimento explosivo: A população dobrou em uma década, com influxo de 15 mil americanos, impulsionando comércio e urbanização, incluindo pavimentação de ruas e novas estradas.
- Cultura e lazer: Clubes como o “USO Club” promoveram bailes e esportes; o filme “For All: O Trampolim da Vitória” (1997) retrata esses impactos sociais.
- Memória preservada: O Centro Cultural Trampolim da Vitória, em Parnamirim, abriga 700 peças, incluindo aviões e uniformes, atraindo turistas e educando sobre o período.
- Dados militares: Mais de 20 mil toneladas de suprimentos passaram por Natal anualmente, e a base ajudou a transportar 1,5 milhão de soldados para a África.
Mais detalhes: USS Humboldt – Wikipédia / Conferência do Potengi – Wikipédia / Informe Publicitário – Solenidade celebra os 80 anos do encontro histórico entre Vargas e Roosevelt – Portal Diário do RN / Natal had big role for US in WWII | AP News / Plan Rubber – Wikipedia / World War II and Brazil | Oxford Research Encyclopedia of Latin American History / Brazil in World War II: The Forgotten Ally | TheCollector / Brazil in World War II – Brazil-U.S. Relations – Research Guides at Library of Congress / Historical Documents – Office of the Historian / BRAZIL’S OVERSEAS MILITARY OPERATIONS / Segunda Guerra Mundial e sua Influência no Rio Grande do Norte – André Valério Sales / Câmara debaterá sobre Natal na rota do turismo da 2ª Guerra Mundial | Câmara Municipal de Natal / A influência católica e dos norte-americanos em Natal é tema de reportagem publicada nos EUA / A influência católica e dos norte-americanos em Natal é tema de reportagem publicada nos EUA / Brazil in World War II – Wikipedia